Banco Central eleva a Selic a 6,25% e mantém ‘plano de voo’ para segurar a disparada da inflação

Bruce Petersons
Bruce Petersons

O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) voltou a subir, nesta quarta-feira, 22, a taxa básica de juros da economia brasileira, passando a Selic de 5,25% para 6,25% ao ano. Foi a segunda vez consecutiva que a autoridade monetária aplica aumento de 1 ponto percentual, levando a Selic para o maior patamar desde junho de 2019, quando estava a 6,5%. A A intensidade do acréscimo já era aguardada pelo mercado financeiro após o presidente do BC, Roberto Campos Neto, afirmar que vai levar a taxa básica de juros para “onde for necessário” para cumprir a meta da inflação, mas que o “plano de voo” não será alterado a cada nova divulgação de dados econômicos de alta frequência. Antes da declaração dada na semana passada, analistas previam o acréscimo de 1,25 a 1,50 ponto percentual em meio à persistência da trajetória de alta da inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que foi a 0,87% em agosto — o maior salto no mês em 21 anos —, e acumulou alta de 9,68% nos últimos 12 meses. A alta aproxima a Selic do patamar neutro — quando não estimula nem freia as atividades econômicas —, estimada em 6,5% ao ano. Porém, a autoridade monetária deve manter o ritmo de aumento nas próximas reuniões e levar a taxa para 8,25% ao fim de 2021, segundo projeções do Boletim Focus divulgadas nesta semana. Para 2022, a expectativa é de 8,5% ao ano. A aceleração deve impactar negativamente na recuperação da economia no ano que vem por refletir na elevação da tomada de crédito e na retração dos investimentos. O colegiado tem mais dois encontros no calendário de 2021 e volta a se reunir entre os dias 26 e 27 de outubro.

Em nota, o colegiado sinalizou que deve fazer mais um aumento de 1 ponto percentual na próxima reunião, elevando Selic para 7,25% ao ano. “O Copom enfatiza que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados para assegurar o cumprimento da meta de inflação e dependerão da evolução da atividade econômica, do balanço de riscos e das projeções e expectativas de inflação para o horizonte relevante da política monetária”, informou a autoridade monetária. O Copom também afirmou que começa a observar o cenário inflacionário de 2023, quando terá a meta de inflação de 3,75%, com variação de 1,75% e 4,75%. “O Comitê entende que essa decisão reflete seu cenário básico e um balanço de riscos de variância maior do que a usual para a inflação prospectiva e é compatível com a convergência da inflação para as metas no horizonte relevante, que inclui o ano-calendário de 2022 e, em grau menor, o de 2023. Sem prejuízo de seu objetivo fundamental de assegurar a estabilidade de preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego.”

Gráfico do IPCA acumulado em 12 meses

O colegiado também reconheceu que o avanço da Selic para o nível que possa impactar na retração das atividades econômicas é necessário nesse momento para segura o IPCA. “O Copom considera que, no atual estágio do ciclo de elevação de juros, esse ritmo de ajuste é o mais adequado para garantir a convergência da inflação para a meta no horizonte relevante e, simultaneamente, permitir que o Comitê obtenha mais informações sobre o estado da economia e o grau de persistência dos choques. Neste momento, o cenário básico e o balanço de riscos do Copom indicam ser apropriado que o ciclo de aperto monetário avance no território contracionista”, informou.

O que pressiona a inflação

O IPCA se aproxima dos dois dígitos pressionado majoritariamente pelo encarecimento dos combustíveis e da energia elétrica. No primeiro caso, a alta é justificada pela elevação do preço do do barril de petróleo no mercado internacional e a manutenção da cotação do dólar em patamar elevado. Já a alta na conta de luz é reflexo da pior crise hídrica que o país atravessa nos últimos 91 anos, que força a diminuição da geração de energia por hidroelétricas e obriga a ativação de estações termoelétricas — mais caras e poluentes. Em ambas situações, não há previsão de arrefecimento. Pelo contrário, a retomada das economias mundiais deve segurar o preço do petróleo no atual nível, enquanto a proximidade do ano eleitoral tende a trazer mais volatilidade ao dólar. As notícias também não são animadoras na outra frente. O governo federal criou, no fim de agosto, a bandeira escassez hídrica, com o valor extra na tarifa acima do cobrado pela bandeira vermelha 2, até então a mais onerosa. A nova cobrança vale até 30 de abril de 2022. Em paralelo, o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, afirmou não haver previsão para o fim da crise hídrica no país.

A degradação das expectativas para a inflação é renovada semanalmente pelo mercado financeiro. A mediana da pesquisa feita pelo BC com mais de uma centena de entidades mostra que a perspectiva para o IPCA foi a 8,35% ao fim deste ano, na 24ª semana seguida de revisão para cima. Em 2021, o BC persegue a meta inflacionária de 3,75%, com margem de 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo, ou seja, entre 2,25% e 5,25%. O aumento da pressão inflacionária deste ano já contamina as expectativas para 2022. Segundo o Focus, o IPCA deve encerrar o ano que vem com alta de 4,1% — a 9ª semana consecutiva de aumento na previsão. Para 2022, a autoridade monetária tem meta de 3,5%, com variação entre 2% e 5%. Apesar da aceleração na deterioração das expectativas, analistas afirmam que o BC tem condições de reverter a piora do quadro para o ano que vem. “O Banco Central precisa insistir na credibilidade, mostrar que ele está comprometido com a meta e que ela vai ser cumprida. Assim ele consegue segurar as expectativas”, afirmou Gustavo Loyola, ex-presidente da autoridade monetária ao site da Jovem Pan. A elevação da Selic compromete a recuperação da economia pelo aumento dos juros e da tomada de crédito. A previsão para o Produto Interno Bruto (PIB) do próximo ano foi revista para baixo pelo mercado, para avanço de 1,63%. Algumas instituições, no entanto, passam a rever as expectativas para menos de 1,5% em meio ao agravamento das pressões nas atividades. “O combate à inflação não é indolor. Ele traz esse efeito negativo para a atividade econômica, mas não tem o que fazer. Se deixar a inflação fugir do controle, a atividade vai sofrer muito mais. É um remédio amargo, mas tem de ser ministrado”, afirmou o ex-presidente do BC.

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