‘Biden está apenas fechando um ciclo e assumindo a responsabilidade’, avalia especialista

Bruce Petersons
Bruce Petersons

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, não é o responsável pela tomada do Afeganistão pelo Talibã após 20 anos. É o que avalia o professor de Relações Internacionais da USP, Samuel Feldberg, em entrevista ao Jornal da Manhã, da Jovem Pan. “O presidente Biden não é o responsável, isso não é um feito dele. Ele está simplesmente fechando um ciclo e assumindo a responsabilidade de retirada das últimas tropas americanas no país. Mas esse é um processo que vem se alongando a muitos anos e foi o presidente Trump que tomou a decisão de abandonar o Afeganistão”, explica.

“Os EUA sempre foram um pouco esquizofrênicos com a sua política externa. Não é a primeira vez que isso acontece. Nós temos o exemplo no Vietnã, que foi lembrado esses dias em função das cenas do aeroporto de Cabul. Nós podemos lembrar também da intervenção norte-americana na Somália, que tinha basicamente a mesma proposta inicial”, lembrou o professor, citando outros exemplos. Para ele, a lição que fica aos americanos é de que tentar modificar e transformar uma sociedade como essa contra a vontade daqueles que tem condições de se articular para tomar o governo é impossível. “Vai ser uma lição também para os aliados americanos ao redor do mundo, que tem que entender que, se não há condições de controlar a população, o território e as forças que estão em conflito, nenhuma intervenção americana vai fazer isso a longo prazo”, completou.

Samuel Feldberg também explicou que, no ponto de vista da geopolítica, a tomada pelo Talibã é um retorno, em certa medida, a uma situação de 20 anos atrás. Mas, do ponto de vista da população, esse tempo foi um respiro. “Olhando do ponto de vista do cidadão, que viveu nos últimos 20 anos, eles tiveram um pouco de normalidade e esperança sem a opressão que o Talibã representava. Pensem nas mulheres e meninas sob o controle do Talibã, que nos 20 anos seguintes puderam dar seguimentos a suas vidas. Ter um pouco de normalidade, sem a repreensão imposta pelo fundamentalismo islâmico. Se eu tiver que olhar para trás através dos olhos do cidadão afegão, talvez tenha valido a pena ter o hiato de 20 anos e um pouco de normalidade na vida”, avalia.

O professor de Relações Internacionais classifica a situação como uma grande tragédia. “O mundo está acostumado a ver trocas de poder em diversos países, mas o que nós podemos esperar desta mudança no Afeganistão é uma enorme tragédia humanitária não só daqueles que vão ser obrigados a ficarem e se submeterem ao governo do Talibã. Nós já vimos no passado e sabemos o que podemos esperar deles. Mulheres, meninas e envolvidos com a promoção de valores democráticos certamente vão ser perseguidos por esse regime fundamentalista islâmico.” Ele lembrou também que toda essa situação deve agravar ainda mais a situação dos refugiados pelo mundo.

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