Biden reconhece que Talibã avançou mais rápido do que previsto, mas não volta atrás sobre retirada de tropas do Afeganistão

Bruce Petersons
Bruce Petersons

Em pronunciamento à imprensa nesta segunda-feira, 16, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, afirmou que continua defendendo a decisão de tirar as tropas do país do Afeganistão mesmo após as imagens de caos e a retomada do poder do país pelo Talibã no domingo, 15. “Depois de 20 anos eu aprendi da forma difícil que nunca haveria um bom momento para tirar as forças do local. É por isso que elas continuavam lá. Estávamos cientes do risco, tínhamos nos planejado para eventuais contingências, mas sempre prometi ao povo americano que sejamos diretos: a verdade é que esse desdobramento ocorreu mais rápido do que nós prevíamos”, assumiu, dizendo que os líderes políticos desistiram e fugiram do país, assim como os militares, que sequer lutaram. “Os soldados norte-americanos não poderiam e nem deveriam lutar e morrer em uma guerra que as forças afegãs não estão dispostas a lutar por elas mesmas”, afirmou. Ele citou, mais uma vez, os altos custos da ocupação norte-americana no país, o fato de que os norte-americanos “pagam o salário das forças armadas afegãs” e o equipamento dado para eles ao longo de anos de treinamento. “Demos todas as chances possíveis para eles determinarem o seu próprio futuro”, pontuou.

“Nossa missão no Afeganistão nunca foi construir a nação, nunca foi criar uma democracia unificada e centralizada, nosso único interesse vital e nacional no Afeganistão continua hoje a ser o que sempre foi: prevenir um ataque terrorista na América”, afirmou. Ele disse que, ao longo de anos, sempre acreditou que o país deveria focar apenas no contraterrorismo e lembrou da época em que era vice-presidente de Barack Obama e se opôs ao aumento das tropas no país, sendo contrariado pelo comandante dos EUA na ocasião. Biden disse, ainda, que o terrorismo de hoje sofreu uma “metástase” que vai muito além do Afeganistão e ocorre na Síria, na península arábica e até mesmo na Somália. “Essas ameaças ganham a nossa atenção e nossos recursos. Conduzimos missões efetivas de contraterrorismo contra grupos em diversos países onde não temos presença militar permanente. Se necessário, faremos o mesmo no Afeganistão. Desenvolvemos contra-terrorismo além da nossa capacidade que vai permitir que mantenhamos nossos olhos fixos nas ameaças diretas aos Estados Unidos e à região”, afirmou. Ele reconheceu que as cenas vistas nesta segunda-feira eram difíceis para os veteranos, diplomatas e trabalhadores humanitários que dedicaram tempo à ocupação norte-americana desde 2001 e lamentou a morte de cidadãos.

O democrata também citou o ex-presidente Donald Trump, disse que o efetivo militar no país da Ásia Central tinha sido vertiginosamente reduzido durante o governo anterior e lembrou de um acordo feito pelo republicano com o próprio Talibã se comprometendo a retirar todas as tropas até maio de 2021. “A escolha que eu tive que fazer como seu presidente foi seguir aquele acordo ou me preparar para lutar contra o Talibã no meio da temporada de combates do país. Não haveria cessar-fogo após o primeiro de maio, também não haveria qualquer acordo que protegesse nossas tropas após este dia”, disse Biden, se referindo ao período entre abril e outubro no qual o grupo fundamentalista intensifica suas atividades militares. Segundo ele, não retirar as tropas no momento implicaria no envio de milhares de norte-americanos de volta ao combate “marchando para a terceira década de confrontos”.

O presidente se mostrou satisfeito com a retirada de diplomatas e o fechamento “bem sucedido” da embaixada dos EUA em Cabul e disse que os poucos milhares de soldados que continuam no país controlarão o aeroporto internacional para retirada de “afegãos vulneráveis e aliados” e também para a saída de voos domésticos com moradores e funcionários de países que quiserem deixar a nação. Segundo ele, cerca de 2 mil vistos de refúgio para afegãos e familiares destes que estão ameaçados já foram aprovados e essas pessoas também deverão ser levadas para os EUA. Na manhã desta segunda, o vice-conselheiro de Segurança Nacional do país, Jon Finer, afirmou que o governo pretende tirar cerca de 30 mil pessoas do país.

Ele também enviou um recado àqueles que acreditavam que as tropas deveriam ficar: “Quantas outras gerações de filhas e filhos americanos nós precisaríamos mandar para lutar uma guerra civil que as tropas afegãs não lutariam? Quantas outras vidas americanas isso valeria?”, perguntou, dizendo que “não iria repetir os erros cometidos no passado”. Por fim, o presidente disse que ação dos militares foi profissional e efetiva e pontuou que assim que todos forem retirados com segurança do local os soldados que restam em terras afegãs voltarão para casa. “Conforme seguimos com nossa retirada, deixamos claro para o Talibã que se eles atacarem nossos funcionários ou interferirem nas nossas operações, a resposta dos Estados Unidos será rápida e poderosa. Vamos defender nosso povo com uma força devastadora se for necessário”, pontuou, pedindo que “Deus protegesse as tropas” que trabalham nas forças de retirada.

Biden lembrou que a guerra já passou por quatro países, disse que “não vai passar essa responsabilidade para o quinto presidente” e que aceitaria as críticas que seguiriam a decisão dele porque “esta é a decisão certa para a América”. Esta é a primeira vez que Biden fala com jornalistas sobre o Afeganistão desde a última terça-feira, 10, quando disse que não se arrependeu de ter tirado as tropas da região e afirmou que os EUA treinaram e equiparam milhares de soldados locais para que eles “lutem por si mesmos”. Na ocasião, as forças insurgentes ainda não tinham chegado à capital, Cabul, e a previsão de serviços de inteligência internacionais era de que a cidade resistisse por cerca de 90 dias. Com a tomada mais rápida do que o previsto, o aeroporto internacional do país registrou um dia de caos com centenas de pessoas tentando entrar em aviões para fugir dos fundamentalistas. Pelo menos sete morreram em pisoteamentos, por disparos de arma de fogo ou caindo de um avião do Exército dos EUA que decolava com resgatados.

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