Bolsonaro cede para conquistar

Bruce Petersons
Bruce Petersons

O presidente Jair Bolsonaro surpreendeu seus adversários, inimigos e apoiadores ao reassumir o protagonismo do diálogo com os demais poderes, principalmente com a cúpula do Judiciário. Na prática, Bolsonaro nem recuou, nem arregou, mas apenas agiu com sabedoria, equilíbrio e pragmatismo – o mínimo que se espera de um Chefe de Estado e de Governo. A oposição já apelou para adjetivos pejorativos, como “frouxonaro”. O governador de São Paulo, João Doria, tuitou: “O leão virou um rato”. O deputado Rodrigo Maia, agora secretário do governo paulista, comentou que a nota de Bolsonaro foi uma humilhação, chamando-o de “frouxo e covarde”. Alguns “bolsonaristas” mais afoitos acharam que Bolsonaro “traiu” milhões de pessoas que foram às ruas em 7 de setembro. Mas a verdade ululante é que o Presidente da República cedeu para conquistar, colocando o interesse do país acima de vaidades, caprichos, conflitos e preferências pessoais. Tudo indica que Bolsonaro agiu como “Estadista”, não como pugilista.

Depois de discursos pesados no 7 de setembro, principalmente alvejando dois ministros do Supremo Tribunal Federal (Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso), Jair Bolsonaro surpreendeu o mundo político e o mercado financeiro com sua nota pública, em tom conciliador, para apaziguar ânimos. Bolsonaro afirmou que nunca teve “nenhuma intenção de agredir quaisquer dos Poderes”. Bolsonaro só faltou pedir desculpas pelos ataques anteriores: “Quero declarar que minhas palavras, por vezes contundentes, decorrem do calor do momento e dos embates que sempre visaram (sic) o bem comum”. (Releve-se até o pequeno erro de português, que passou despercebido até do ex-presidente Michel Temer, que ajudou a escrever a nota, já que o verbo visar é transitivo indireto: o certo seria “visaram ao bem comum).

Bolsonaro “cedeu para conquistar” (um provérbio de guerra japonês da idade média). Mas, depois da nota, na habitual live de quinta-feira à noite nas redes sociais, o presidente voltou a manifestar suas críticas ao Tribunal Superior Eleitoral e seu presidente Luís Roberto Barroso em relação à rejeição do voto impresso pelas urnas eletrônicas para recontagem pública de 100%, na própria seção eleitoral. Por maioria, o STF reafirmou a inconstitucionalidade da lei do voto impresso. Curioso foi o argumento do relator Gilmar Mendes, acompanhado pela maioria dos ministros: “A impressora poderia ser uma via para hackear a urna, alterando os resultados da votação eletrônica e criando rastros de papel que, supostamente, os confirmassem”. Traduzindo: o sistema é frágil e ponto final. Detalhe relevante: a eleição 2022 será comandada por Moraes, que presidirá o Tribunal Superior Eleitoral.

As manifestações de rua no 7 de setembro foram impressionantes, sob todos os aspectos. Uma parcela expressiva da população, notadamente famílias de classe média, trocaram o descanso do feriado por uma incansável vontade de mostrar, publicamente, que deseja reformas e mudanças de verdade. Uns eram mais radicais, muitos mais equilibrados, porém todos agiram pacificamente. Bolsonaro fez dois discursos contundentes. Em Brasília, anunciou que convocaria o “Conselho da República” – o que assustou o establishment. Em São Paulo, xingou Alexandre de Moraes de “canalha” e advertiu que não cumpriria ordens judiciais inconstitucionais. Ontem, depois do almoço-reunião com Michel Temer e a divulgação da nota (com todo estilo literário, jurídico e político do marido da bela Marcela), Bolsonaro apostou na “conciliação”. Agora, o foco é aprovar a agenda de reformas. Cabe ao Supremo e ao Congresso Nacional colaborarem. O presidente tem força e confiança da população – comprovada nas ruas.

A nota:

No instante em que o país se encontra dividido entre instituições é meu dever, como Presidente da República, vir a público para dizer:

  1. Nunca tive nenhuma intenção de agredir quaisquer dos Poderes. A harmonia entre eles não é vontade minha, mas determinação constitucional que todos, sem exceção, devem respeitar.
  2. Sei que boa parte dessas divergências decorrem de conflitos de entendimento acerca das decisões adotadas pelo Ministro Alexandre de Moraes no âmbito do inquérito das fake news.
  3. Mas na vida pública as pessoas que exercem o poder, não têm o direito de “esticar a corda”, a ponto de prejudicar a vida dos brasileiros e sua economia.
  4. Por isso quero declarar que minhas palavras, por vezes contundentes, decorreram do calor do momento e dos embates que sempre visaram o bem comum.
  5. Em que pesem suas qualidades como jurista e professor, existem naturais divergências em algumas decisões do Ministro Alexandre de Moraes.
  6. Sendo assim, essas questões devem ser resolvidas por medidas judiciais que serão tomadas de forma a assegurar a observância dos direitos e garantias fundamentais previsto no Art 5º da Constituição Federal.
  7. Reitero meu respeito pelas instituições da República, forças motoras que ajudam a governar o país.
  8. Democracia é isso: Executivo, Legislativo e Judiciário trabalhando juntos em favor do povo e todos respeitando a Constituição.
  9. Sempre estive disposto a manter diálogo permanente com os demais Poderes pela manutenção da harmonia e independência entre eles.
  10. Finalmente, quero registrar e agradecer o extraordinário apoio do povo brasileiro, com quem alinho meus princípios e valores, e conduzo os destinos do nosso Brasil.
Share This Article