Neymar e Patrícia Pillar brigaram por política, não por Pelé

Bruce Petersons
Bruce Petersons

Nesta semana, houve mais um confronto nas redes sociais, desta vez entre a atriz Patrícia Pillar e o camisa 10 da seleção brasileira, Neymar, após a vitória de 2 a 0 sobre o Peru. No final da partida, o jogador declarou que está cada vez mais próximo do recorde de gols de Pelé na história da seleção, com 69 de sua autoria contra 77 do Rei. No Twitter, Patrícia Pillar criticou o posicionamento do atleta, acusando-o de dar uma declaração inconveniente, uma vez que Pelé, de 80 anos, se encontra hospitalizado por causa de uma cirurgia de retirada de um tumor. Segundo ela, é “lamentável” o desejo do camisa 10 de ultrapassar Pelé na artilharia da seleção. Pura balela. Na verdade, o que se apresenta por trás dessas declarações é, novamente, um embate político entre partes que são opostas e que se esquecem da imagem que deveriam passar para nós, público expectador, como artistas e atletas que representam o Brasil. Até quando seremos obrigados a presenciar esse cenário de pouco diálogo, que faz cair por terra o valor de cada um, em detrimento de uma batalha que divide, no lugar de agregar?

Quanto aos internautas, estes têm julgado Neymar por seu posicionamento em defesa do presidente Jair Bolsonaro, em razão do jogador ter postado uma foto nas redes sociais, logo após as manifestações do 7 de setembro, segurando uma bandeira do Brasil. Após o post, manifestações contrárias pipocaram nas redes, como a do ex-jogador Casagrande, que apelidou Neymar de “súdito de Bolsonaro”, após declarações sobre a Copa América. Para o comentarista, o atleta é parceiro de um “governo negacionista”. Aonde vamos parar? Nessa batalha, a arte do futebol fica esquecida, e o que importa é quem apoia quem na política. Precisamos amadurecer politicamente. É direito de cada um escolher seus representantes. Parece que não vivemos em um regime democrático, defensor da liberdade de opção e expressão. O que se vê são antagonismos acirrados que colocam uns contra os outros, que acabam esquecendo quem são, a que vieram, o que representam na sociedade. Para esses cidadãos midiáticos, o que leva-se em conta é “de que lado você está”. Às vezes, imagino que a Constituição do nosso país não é respeitada e existe para definir o Brasil como uma nação democrática, o que na realidade se apresenta de forma diversa. Cansei de falar em inversão de valores, mas infelizmente a coisa se repete.

Não bastando isso, depois de toda a confusão com Patrícia Pillar, outros artistas se manifestaram contra Neymar. A cantora Zélia Duncan afirmou que o camisa 10 é uma “decepção como cidadão e que deveria pagar seus impostos”. Em um post no Twitter, ela declarou: “Não sou de futebol, mas Neymar me parece até agora uma promessa como atleta e uma decepção como cidadão. Quer respeito, dê-se a ele e mostre serviço. Ah, e pague seus impostos”. Em contrapartida, o clã de apoiadores de Neymar manifestou apoio ao pai do jogador, que recentemente participou de um almoço com o presidente, em Brasília, demonstrando seu apoio ao atual governo. Mais um evento político que separa ainda mais os defensores e os críticos do governo. Por outro lado, novamente em pauta, Patrícia Pillar se posicionou nas redes a favor do pretenso candidato à presidência da República, Ciro Gomes (PDT), nas próximas eleições, ao se defender de falsas declarações de que estaria apoiando Jair Bolsonaro e que sofrera agressões físicas por parte de Ciro, com quem foi casada por 12 anos. Notícias que nada acrescentam à carreira da atriz, muito menos nos interessam sobremaneira. Apoiar ou não um candidato ou político em exercício não nos faz admirar mais ou menos essas figuras como atletas e artistas. E se existe alguém que assim o faz, é hora de rever sua opinião. Somente quando soubermos separar uma coisa da outra, teremos condição de dar valor a quem nos representa, seja nas artes, ou em quaisquer outras áreas que requerem talento.

Enquanto Neymares e Patrícias forem julgados por seu posicionamento político, que é visível nos dias atuais, seu talento ficará em segundo plano. Uma frase que me vem à mente é a célebre “Viva e deixe viver”, termo utilizado durante a Primeira Guerra (1914-1918), como uma abstenção deliberada do uso da violência durante a guerra, em forma de tréguas ou acordos de comportamento, em que ambos os lados decidiam pelo cessar fogo, mesmo que por um determinado período. E as histórias se repetem de formas diversas. Tem hora que o “cessar fogo” se faz necessário como reflexão. Vamos criar uma trégua para os confrontos desnecessários entre quem pensa diferente e deixar fluir o que realmente importa: o valor de cada cidadão, em um regime democrático de direito.

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