Quem tem medo do Supremo Tribunal Federal? Eu

Bruce Petersons
Bruce Petersons

“A senhora tem medo do Supremo?”, foi a pergunta que fiz de chofre para a deputada Carla Zambelli (PSL-SP). Confesso que a resposta me surpreendeu: “Sim. Tenho muito medo”, disse a deputada, desconfortável com a situação. Ela emendou que quando um representante do povo tem medo de falar ou avaliar um poder, é a indicação clara de que há algo errado. A Constituição já assegurou imunidade total ao parlamentar. Aos poucos, estas garantias foram sendo cortadas. A proposta do constituinte foi de dar segurança à sociedade. A imunidade não seria como uma garantia individual ou anexo do parlamentar, mas para que ele tivesse liberdade total para defender o cidadão. Não deu certo porque deputados sequestraram a prerrogativa para os seus crimes pessoais. Hildebrando Pascoal recebeu a alcunha de “O Homem da Motosserra”. Ele simplesmente serrou aos pedaços um adversário político. Naquele momento, o Supremo só poderia abrir processo com autorização do plenário da Câmara. Os pedidos ficavam amontoados no Congresso, sem avaliação. Neste caso do ex-coronel da Polícia Militar do Acre, não foi diferente: ficou parado por um bom tempo. A pressão aumentou. Os líderes se reuniram e decidiram cassar o mandato de Pascoal, para não abrir exceção de autorizar abertura de processo contra um parlamentar. 

Os próprios deputados e senadores mudaram a Constituição, e a imunidade acabou apenas para palavras e votos. Por insistência da deputada Cidinha Campos, houve uma nova emenda. Condenada a pagar indenizações, incluiu a palavra “quaisquer”. O texto não fala em imunidade, mas em inviolabilidade. Os deputados serão invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos. Há uma diferença entre os dois conceitos: imunidade entra na blindagem de crimes, inviolabilidade garante ao parlamentar o direito, mas não evita a abertura de processo e julgamento. A intenção era de autoproteção. 

O constituinte nem imaginou que, no futuro, em 2021, um ministro do STF poderia determinar a prisão de um deputado por falas contra o Supremo. Um discurso tosco, errado e raivoso, mas feito por um deputado em pleno exercício do mandato. Daniel Silveira está preso, impedido de exercer sua representação, mesmo que por telefone, e sem possibilidade de recorrer. A prisão está confirmada pelo plenário do Supremo, a mais alta instância. No clima tenso da Justiça, por determinação do ministro Alexandre de Moraes, policiais entram na Câmara, vasculham o gabinete do deputado Otoni de Paula. As buscas chegam também na casa do parlamentar. Levam-se documentos, telefones e equipamentos eletrônicos em busca de provas de participação em um grupo criminoso de ataque às instituições democráticas. A mesma operação vai amiúde e entra na casa do cantor sertanejo e ex-deputado federal Sérgio Reis

O deputado Otoni de Paula exagera. Em publicação, chega a chamar o ministro Alexandre de Moraes de “cabeça de ovo” e outras palavras que não vou repetir. Se refere ao Supremo Tribunal Federal como esgoto e lixo. O deputado já foi condenado a pagar indenização de R$ 70 mil reais a Moraes. O curioso é que, na atividade privada, o feroz deputado é um pastor evangélico que gostaria de ser reencarnado como boi. O que assusta mesmo deputados e profissionais é a incerteza e ações duras da Corte. Sérgio Reis, um ex-deputado, reconheceu que falou demais, mas assegura que não iria “tirar os caras de lá” (como se referiu aos 11 ministros do Supremo). Não adiantou. Quem teve acesso ao inquérito das fake news fala de graves atos. Atentados reais contra ministros e familiares. Explosão de bombas nas portas das casas e organização enraizada nas mídias sociais. Não é um processo qualquer. O grande debate é sobre a origem do inquérito e a iniciativa do Supremo até para quem não tem foro especial. O processo está em andamento. 

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