Talibã tenta se mostrar moderado, nega retaliações e promete direitos a mulheres dentro da lei islâmica

Bruce Petersons
Bruce Petersons

Após tomar o poder à força no Afeganistão, o Talibã trabalha para mostrar ao mundo que não é mais a organização que aterrorizou o país do Oriente Médio entre 1996 e 2001. Calcado em uma interpretação extremista do Alcorão (o livro sagrado do Islã), o regime fundamentalista reprimiu principalmente as mulheres, que, entre outras restrições, não podiam usar vestidos ou maquiagem, eram impedidas de estudar, trabalhar ou sair às ruas sem uma presença masculina. A comunidade internacional acredita que muitos direitos conquistados por elas nas últimas duas décadas irão por água abaixo com a volta dos talibãs. O grupo, no entanto, diz que não haverá retrocessos.

“Vamos permitir que as mulheres trabalhem e estudem dentro de nossas estruturas. As mulheres serão muito ativas em nossa sociedade, dentro de nossa estrutura, de acordo com a lei”, disse Zabihullah Mujahid, porta-voz do Talibã, em entrevista coletiva. O grupo diz ainda que deseja que as mulheres façam parte da nova estrutura de poder do Afeganistão. Em uma tentativa de fazer o movimento parecer moderado, um líder talibã ligou para Yalda Hakim, apresentadora da BBC que deixou o país ainda criança para viver na Austrália, e fez promessas que apontam para a paz. “Não queremos confusão. Garantimos ao povo do Afeganistão, na cidade de Cabul, que suas propriedades e suas vidas estão seguras.” São raras as entrevistas de líderes do Talibã a jornalistas mulheres.

Também foram feitas promessas na direção de quem combateu o movimento extremista durante os últimos 20 anos. De acordo com a alta cúpula do Talibã, não haverá nenhuma retaliação aos soldados que serviram à guarda nacional. Um anistia geral foi anunciada. “Queremos assegurar que o Afeganistão não seja mais um campo de batalha. Perdoamos todos aqueles que lutaram contra nós, as animosidades acabaram. Não queremos inimigos externos nem internos”, declarou Mujahid. O grupo extremista faz um apelo para que todos os cidadãos afegãos voltem aos seus afazeres cotidianos a partir de agora.

No entanto, as promessas dos fundamentalistas são encaradas com ceticismo pela comunidade internacional, informou Rupert Colville, porta-voz da Organização das Nações Unidas (ONU) para direitos humanos. O trecho da declaração de Mujahid em que ele expressa que “as mulheres serão importantes, de acordo com a lei” é encarado com temor. A rígida interpretação da sharia (estrutura de leis baseada no Alcorão) levou o país a uma taxa de 70% de analfabetismo entre as mulheres, além da imposição de penas como apedrejamento e mutilação. Não à toa, milhares de afegãos arriscaram a vida para tentar fugir de um regime que pretende se vender como moderado, mas é reconhecidamente extremista.

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